SORTE?
A sorte não existe. Aquilo a que chamas sorte é um cuidado com os pormenores.
Winston Churchill
Não sei por que raio terei que ser assim, preocupada com os significados das coisas, necessitada de ver nelas uma intencionalidade, um substrato qualquer que lhes dê sentido. Não sei por que raio terei que buscar, buscar, buscar sem fim tudo isso nas evidências e relações que me rodeiam, tornando-me intuitiva, ativa e emocionalmente atenta a sinais, gestos, mensagens que não vêm escritas. Mas sempre fui assim. Também no que aos amores diz respeito.
E não foi um amor à primeira vista o que senti quando te conheci. Por mais que ache glamourosa a ideia que se vê nos filmes, daqueles clicks assim super-sónicos de olhar, toque, ou expressão, cá para os meus lados não foi nada assim que se passou. Achei-te até um pouco irritante.
Depois, aos poucos, embalada pelas circunstâncias que nos aproximavam, comecei a descobrir-te e do alto da minha adolescência, hoje longínqua, esta preocupação com os significados já se fazia sentir, ajudando-me a ver com outra lente a pessoa em que te ias transformando para mim. E cresci contigo e tu cresceste comigo e descobri contigo uma série de coisas e tu também descobriste comigo as mesmas e outras coisas e isso aproximou-nos e cimentou uma relação que não é de conto-de-fadas, mas sim de vida real, de todos os dias, tangível e próxima, que se escreve assim com sapos e príncipes e princesas e todos aqueles e aquelas em que às vezes nos transformamos. E HÁ ESPAÇO para todos nessa vida.
Dizem-me, às vezes, que vou sendo caso raro no que toca à vida sentimental, que acertei e que depois tive sorte. Não sei se assim será. Gosto da frase do Churchill, aquela da junção dos pormenores, porque me torna um pouco agente de mudança e ação em vida e causa próprias e gosto mais dessa ideia que isenta o ACASO...
Só queria mesmo, mesmo, mesmo a sério que esta sorte se espelhasse também nas aventuras (pode ler-se mudanças) profissionais que vou abraçando. Queria que um grande e profundo amor pudesse nascer daqui, como aquele outro que vivo contigo, que pudesse ter desalentos, zangas, sapos e príncipes, que tivesse significado e intencionalidade, que me fizesse brilhar o olhar quando dele falo, que pudesse encantar-me, mesmo com as marés tão contrárias que por todo o lado se fazem sentir.
Por que raio terei que ser assim tão preocupada com isto? Poderia só viver o dia-a-dia sem mais nada, deixando fluir...
Pois poderia, mas não seria eu.
É que gosto de pensar que isto pode ser um cuidado com os pormenores e isso, quem sabe, me possa vir a dar alguma sorte...