quinta-feira, 20 de junho de 2013




BRILHO MAIOR?

Lembro-me de ir à padaria ao fundo da rua, logo de manhã, antes da praia e comprar mais de 40 papossecos (!!), porque tínhamos a casa sempre cheia de gente que vinha para férias no Algarve. A minha mãe depois fazia muitas sandes, com ovo cozido, atum, tomate, alface, pasta de sardinha, rodelas de pepino, pedrinhas de sal. Enchia garrafões de sumo e dividia a carga por todos, conferindo tarefas e distribuindo-nos pela mão dos mais velhos, primos e primas que povoavam a minha casa, alguns dormiam em colchões no chão, outros, nos sofás que eram do tipo cama (hoje, "tiro o chapéu" à minha mãe por tão boa gestão de tão grande logística...); lembro-me de irmos para a praia e ficarmos à sombra de um toldo de lona, triangular, listado com cores garridas, que dava uma sombra enorme, muito maior que qualquer sombrinha. Levava muito tempo a montar, mas no fim valia a pena e como éramos sempre muitos, compensava o esforço; lembro-me de saltarmos das falésias sem medo nenhum, fazendo despiques para ver quem saltava de mais alto; lembro-me de fazer campismo selvagem com pai e mãe e irmão e primos e primas e de lavarmos a loiça na areia molhada, esfregando-a muito com a areia que fazia de esfregão; lembro-me de saltar das costas do meu pai que raramente tomava banho de mar, mas que era um nadador exímio e que nos ensinou a nadar a todos, com braçadas largas de crall, sem viragens tontas de cabeça, tipo cata-vento; lembro-me de fazermos serões na costa da ilha onde acampávamos e de eu e o Nuno olharmos embevecidos para os primos e primas mais velhos que tocavam viola e cantavam, à noite, à volta de uma fogueira, envolvendo-nos numa aura de magia e encantamento como aquele que é dado pelos mais velhos e sentido pelos mais novos; lembro-me de apanharmos o barco da carreira e de irmos com os pés de fora porque ainda não era proibido; lembro-me do mergulho nas ondas e das carreirinhas que fazíamos numa costa que às vezes era perigosa. 
Uns anos mais tarde, poucos, muito poucos, completo estas memórias de Verão, com a aldeia minhota do meu avô materno, onde passávamos férias  absolutamente maravilhosas: os banhos no rio Neiva que tinha uma cascata maravilhosa que fazia ondinhas de espuma quando a água caía e se juntava à outra água que já lá estava; lembro-me de andar à beira da estrada com as primas e de eu ir pisando os carreirinhos de escaravelhos, ouvindo, preversamente o som dos bichos a serem esborrachados e a rir com isso; lembro-me de visitar primos e primas e tios e tias que tinham um sotaque engraçado que eu rapidamente apanhava e que nos levavam a ver a ordenha e os currais e os galinheiros e todos os outros bichos que eram tão distantes da minha realidade urbana, de menina de cidade; lembro-me das alvoradas de Agosto, sempre frias e enevoadas nesse alto Minho; do cheiro do leite com cevada a arrefecer nas malgas enquanto nos vestíamos para o pequeno-almoço, do cheiro da broa de milho quentinha; da tia Beatriz, irmã mais velha do meu avô, a quem todos chamavam "avozinha" e que era a velhinha mais bonita e cheirosa que os meus olhos de menina já tinham visto,( http://agridoceedoce.blogspot.pt/2013/02/beatriz-versus-irena-minha-mae-punha.html) enfim!!! Há tantas coisas de que me lembro dos meus Verões e todas essas lembranças ajudaram a completar o meu desenho como pessoa!!!
Começa amanhã o Verão e é a minha estação do ano preferida porque colo agora estas memórias a outras, recentes, muito recentes, coladas ao dia de hoje, de ontem, imediatamente próximo, coladas à ideia de férias, de descanso, de passeios, de esplanadas com conversas jogadas fora, de despreocupação relativa com horários, com rotinas tão massacrantes, às vezes. O Verão funciona para mim como uma pausa entre ciclos e uma doce anestesia à qual já me habituei!! Todos os momentos têm encantos próprios, acho mesmo que nós é que os construímos, mas pronto, o Verão é o Verão e terá sempre para mim uma carga especial.
E amanhã, que é o maior dia do ano, terá o céu um brilho maior?
Bons mergulhos!!!

5 comentários:

  1. Paulinha!

    Eu não toca a guitarra mas cantava com os outros em volta dessa mesma fogueira!! Tempos que não voltam mais...
    Também me lembro da ''avozinha'' Beatriz e da sua casa a cheirar a bom presunto e chouriça caseira e das rodas de broa que pareciam as rodas dos carros de bois de tão grandes. Lembro-me da lareira sempre acesa e de um episódio bem engraçado em que a Tia Beatriz mandou o meu irmão Tozé, com seis anos e muita sede, por a boca no barril do vinho quase causando uma apoplexia ao meu pai!
    Lembro-me de te visitar em Portimão e de os teus pais ficarem super contentes por me verem e vocês ainda miúdos... enfim são as memórias de um passado, de uma família que eu amo muito!! beijinhos do primo Fernando

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  2. E assim, enquanto li todas estas recordações também eu andei para trás na vida, tantos anos, também recordei as primeiras braçadas de mar ensinadas pelo meu pai e até as sandes de ovo que levava para a praia. Tão bom quando alguém se lembra daquilo que a vida atarefada nos obriga a esquecer. Que boa esta partilha

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  3. Que lindo! Eu também gosto muito do verão e tenho recordações muito saborosas desse período estival. E hoje ao ler o teu texto, veio-me de imediato à memória umas férias comunitárias de verão vividas há já alguns anos (fazendo contas… até já são muitos anos mesmo).
    Quando eu tinha 16 anos conheci o Nuno (o teu irmão), ele mais velho que eu, quando integrámos o mesmo grupo de jovens numas férias comunitárias de verão em Querença. E recordo, tantas vezes, com muita saudade e um grande sorriso, eu e ele por aquelas ruas desertas de Querença, sob um sol quente que picava na pele à procura de alguém que nos desse trabalho em troca de alimentos para o almoço (era a nossa tarefa dessa manhã).
    Rimos a bom rir os dois! Ninguém nos dava trabalho para fazer! As pessoas muito queridas, com uma simpatia especial que existe nas pessoas do campo, punham-se à conversa connosco, aproveitando a quebra do isolamento, davam-nos água e bolinhos. Riam-se quando perguntávamos se podíamos fazer alguma coisa para ajudar e respondiam que “vou agora dar trabalho a uns meninos tão doces”! E enchiam-nos o saco com conservas, fruta, legumes e fruta.
    Regressámos a casa divertidos, mas com o sentimento de missão não cumprida, porque apesar de recebermos os alimentos, não tínhamos trabalhado nada! O Nuno dizia que a culpa era minha, porque tinha um ar angelical e passou a chamar-me “menina copo de leite”!
    Depois disso, sempre que estávamos juntos, lá vinha esta história e fiquei para sempre a “menina copo de leite”!
    Realmente, no verão vivemos experiências que se nos agarram ao coração e ficam para sempre em nós!

    (senti que tinha que partilhar esta recordação contigo!)

    Beijinhos,
    Ana Horta

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  4. Que boa esta partilha, Ana, que boa mesmo!!! Tenho ideia do Nuno falar dessa experiência em Querença, como tendo gostado muito e é giro ver o que nos vem à memória assim que "puxamos um fiozinho invisível"! E olha, continuas com um ar angelical!!!
    Beijinhos,

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  5. Realmente recordar é viver, esta sabedoria popular do ditado do povo, é mesmo verdade!!
    Ao ler-te,lembrei-me, obviamente, dos acampamentos selvagens, diríamos agora, e de ir atrás de um pescador amigo da família, contigo e com o Nuno pela mão, atravessando toda a baía da fuzeta, por uma língua de areia que não podíamos de maneira nenhuma deixar que os pés resvalassem, se não afundar-nos-íamos, quando a maré estava baixa para os barcos passarem - antes das últimas obras - mas que só podia ser atravessada por aquela língua de areia - para ir convosco a um espetáculo para crianças na lota da Fuzeta, imagina bem!! Claro que me lembro muito bem desse toldo que, chegados se Angola, era impensável conseguir sombra de outra forma. Lá esses toldos eram o normal, aqui não é claro, mas foi o teu pai que o mandou fazer. Que será feiro desse toldo? Enfim, continua a escrever para nossa delícia e seria muito bom que voltasse a haver férias comunitárias do estilo das de Querença, agora, para os teus filhos, não achas?
    beijinhos

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