sexta-feira, 16 de agosto de 2013





VERDADES DE LA PALISSE


É engraçado o que se observa num supermercado, seja nas filas das caixas, seja à espera dos atendimentos. Hoje, bati de frente com uma dessas sérias verdades, tão verdade como as de La Palisse...
Estava em jejum e era imperioso que comesse depressa, mas tinha decidido fazer as compras cedo, deixando a família toda a dormir ainda. Por isso, saí pé ante pé, antes que alguém desse por mim. O dia seria cheio e isso fez com que, um pouco empurrada pela necessidade, lá me tivesse decidido a ser das primeiras a entrar no dito supermercado para enfrentar um carrinho de compras, daqueles típicos de uma casa cheia de gente faminta, sempre! Resolvi ir tomar o pequeno-almoço na própria cafetaria do dito recinto para poupar tempo, julgava eu, já que era urgente que ingerisse cafeína, na esperança que essa me suavizasse um pouco o humor... não sou ninguém antes de beber o primeiro café da manhã!!... Lá chegada, eis a primeiríssima e inesperada  fila de gente que tivera a mesma ideia que eu! Bem, restava-me esperar, pensei, mas não pude deixar de sentir uma ligeira nervoseira (esta palavra existe?), como se não estivesse à espera e quisesse já despachar-me, mas que chatice, olha que isto, agora ainda tenho que esperar... 
Estavam três, ou quatro pessoas à minha frente e nenhuma delas parecia ter uma vida agitada, já que se prolongavam em demoras dignas de uma observação atenta: uma senhora idosa acompanhada de uma amiga que lhe estava a guardar a mesa preferida como se não houvesse outra, um senhor também idoso acompanhado de uma garota, talvez neta, ou sobrinha, que se ria muito das graçolas que ele levava o tempo todo a dizer, olhando depois à volta para ver se via nos outros olhares cúmplices de quem acha graça ao que ele dizia e um rapaz com um ar absolutamente zen que não sabia a diferença entre uma carcaça e uma baguete. Era portuguesíssimo sim senhor, mas não sabia e a funcionária explicava-lhe com uma mímica engraçada e expressiva, mas ainda assim não ia lá, o que a obrigou, solicitamente, a ir lá dentro, não sei onde porque demorou, (só sei que entrou por aquelas cortinas cerradas, de plástico, às tirinhas...) buscar ao vivo, uma dita baguete e uma dita carcaça, para que ele as visse e decidisse o que queria! Tudo isto ia levando eternidades, achava eu, mas para quê tanta simpatia, bolas, umas são de mais e outras de menos, exasperava eu! Ai o que a falta do café faz.... Eis que chega a minha vez... peço o que tenho a pedir, correspondo ao sorriso simpático da funcionária simpática e expressiva (consegui lembrar-me, mesmo em jejum, da recetividade que sinto sempre à simpatia dos outros!!), pago o que tenho a pagar e vou para uma daquelas mesinhas sem cadeiras, redondinhas, no meio dos caminhos, mesmo para comer em pé... Aí ainda vejo o velhinho que tentava ser engraçado a voltar ao balcão, com o galão na mão, já meio bebido e a pedir à menina (como ele dizia) que é tão simpática, que lhe ponha mais duas bolinhas de adoçante que assim está meio amargo... mas já bebeu quase metade, assim mais vale um pacotinho de açúcar, diz ela quase zangada, mas oh querida, assim fico com um amargo de boca, vá lá não seja assim!!! Lá foi ela outra vez lá dentro das cortinas de plástico buscar a embalagem do adoçante e lá voltou e lá estava na mesma outra fila de gente à espera! Agora, já eu observava de cafeína nas entranhas, suavizando-me o humor e já um ligeiro sorriso para dentro pude esboçar, rendendo-me ao fenómeno sociológico da questão! Talvez este momento do dia seja a hora social de muitas daquelas pessoas, o seu almoço ou jantar fora, a sua ida ao cinema, o seu passeio... talvez para muitos estes momentos sejam de deleite assim, puro e simples e não de pressa e confusão como para mim, mas, confesso, mesmo assim temperada e condescendente devido ao efeito da cafeína em mim, de certeza, não me atrevi a voltar ao balcão e a pedir à funcionária simpática e solícita que me embrulhasse a metade do pão que pedira e que não conseguira comer toda, receando que isso a fizesse desaparecer para dentro das cortinas de plástico à procura de um saquinho de papel onde eu o pudesse pôr!!! E assim, o acabei de engolir...



1 comentário:

  1. Mas que texto tão giro. É verdade que, nos momentos de espera, observamos o que está à volta, imaginamos e estamos de ouvido à escuta de tudo e de nada, como se tivesse algum interesse. Também me divirto imenso com isso.
    Boas férias e muitos beijinhos

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