quinta-feira, 25 de abril de 2013



FALO CHINÊS?


Perguntei-lhes, a propósito da visita de uma escritora ao espaço da nossa escola, se sabiam o que era uma escritora... o que fazia, qual era o seu trabalho... Daí até aos livros, às bibliotecas, à leitura e ao mundo que existe fora da escola e do circuito viciado que relatam: "ESCOLA/CARRO/CASA/CONTINENTE/CARRO/CASA/ESCOLA (outra vez...)/CARRO/CONTINENTE/CASA... (e por daí em diante em circuitos limitados e sempre iguais e passo a publicidade...), foi um passo e fiquei triste!!! Menos de 1/4 dos meninos e meninas da minha sala nunca tinham ido à Biblioteca Municipal da sua cidade, mesmo aquela sendo um espaço público, gratuito e com horários relativamente estendidos para as várias realidades laborais. Não conheciam o espaço, nunca lá tinham ido e então, ajudada pelos meninos e meninas que já o tinham feito, falei-lhes da biblioteca da sua cidade, do nome que tem (acharam graça à biblioteca ter o nome de uma pessoa, uma escritora com um nome bonito, ainda por cima!), dos espaços que a compõem lá dentro, das coisas que lá dentro se pode fazer... mostrei-lhes os meus cartões de utente das bibliotecas das várias cidades por onde tenho passado enquanto Educadora e penso que me acharam mesmo uma fã dos livros e afins, mas então, nós quando gostamos, falamos com os olhos e os braços e a cara e o corpo todo... Fizemos um "convite-a-convidar-os-pais-a-que-nos-levassem-à-biblioteca-da-nossa-cidade-porque-ouvimos-dizer-que-é-bonita"...
 Tudo isto me fez viajar para fora da escola e para dentro das "vidinhas" dos nossos meninos e meninas, muitos deles, pelo menos e não todos, felizmente... Não têm experiências de vida para além daqueles circuitos viciados, ou de outros parecidos àquele, não cultivam o gosto por conversar, porque também pouco conversam com eles, não expressam (ou expressam mal) uma opinião, porque também nunca são ouvidos (mesmo que a sua opinião não seja vinculativa, mesmo que seja só para ser ouvida, partilhada...), não param para ouvir o OUTRO, porque ninguém lhes diz nunca que o OUTRO pode ter alguma coisa de interessante para dizer...
Pois é!!! É assim que vamos estando e é isso que se reflete nos grupos e na capacidade de concentração/atenção/motivação... Hoje, uma amiga professora comentava também no seu blog que às vezes, sente um "fosso" entre aquilo que propõe que os alunos aprendam e aquilo que os motiva (era mais ou menos este o sentido...) e é verdade e eu sinto isso nos pequenitos, da pré. Comparativamente à altura em que comecei a trabalhar, há uma diferença gigantesca que nos obriga também a dar passos gigantescos e a fazer quase o "pino" para os motivar... ainda vamos tendo sorte, porque a idade deles, aliada à nossa capacidade e gosto pelo que fazemos, ainda vão fazendo milagres, daqueles mesmo verdadeiros!
Pois é, outra vez... Por isso é que me apeteceu gritar para dentro (ali tinha que ser para dentro!!!) quando uma mãe me disse que se tinha zangado veementemente com o filho porque não LHE ADMITIA (...cito...) "desenhos como aquele, muito riscados, feitos à pressa, sem gosto... ía para o primeiro ciclo e aquilo não podia ser, ía insistir muito com ele no Verão, tinha que o pôr a ter outro brio"... blá, blá, blá... Juro que encetei com ela uma conversa construtiva, enquadrei-lhe a pressa do filho (os outros estavam todos lá fora a brincar...), sensibilizei-a para as conquistas que ele tem feito, para os inúmeros conhecimentos que tem em muitas áreas, (o que o distingue, para melhor, em relação aos outros), para o tempo que às vezes leva o CRESCER e o ADEQUAR RITMOS, para o facto da expressão plástica não ser a área forte dele e daí o pouco brio, para o mundo de coisas que tem que conquistar antes da leitura e da escrita... Apelei para o q.b (ralhar sempre, mas quando e se...), para a importância das tais experiências de vida diversificadas que falo acima, para o facto de isso os completar tanto como pessoas pequeninas e de os ajudar a crescer, mas subitamente, (quase!) desisti e foi quando reforçou as lágrimas que o menino tinha deixado cair aquando da sua reprimenda:... "sentidas, professora, sentidas!"...
Aí, apeteceu-me perguntar-lhe:  - "eu falo chinês???" 

3 comentários:

  1. Pois é às vezes ficamos a falar sozinhos...! Mas, memso com a sensção de que "falas chinês", não deixes nunca de falar com amorosidade persistente...!Semeia, semeia....não te importes com quem venha a colher, para esse miúdo, talvez a semente ainda venha a frutificar e quem sabe se também para a mãe dele?! Beijinhos.

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  2. Pois, amiga, esse fosso de que falava é criado por um fosso que também existe lá em casa entre pais e filhos. Ainda ontem, na formação do Adriano, falava-se da importância de nos pormos em causa como professores e acho que os pais não costumam pôr-se em causa e apenas valorizam o suporte escrito. Parece que o que aprendem num todo é desvalorizado e pouco importante. É triste mesmo que os miúdos tenham apenas como experiência de passeio familiar as idas ao Continente, os passeios (ou idas) de carro de casa para a escola ou para as compras. Por isso existe um fosso entre um simples vocabulário que se espera que seja construído em casa, no seio familiar, desde tenra idade, desde o Pré-Escolar ou da primeira infância.
    Que texto tão rico esse teu. Eu ando meio desmotivada também a "empurrar" a minha escrita.
    beijinhos grandes

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  3. Não desistas amiga... "empurra" a tua escrita, sempre, com persistência! Serve de catarse, juro... bj grande!

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