MEDO II
(e copinho de leite morno)
No seguimento da história de ontem, ao grupo, chegou uma delas hoje perto de mim, pediu-me que me baixasse e disse-me ao ouvido. "-Sabes, eu bebi o tal copinho de leite morno e a minha respiração ficou mais quentinha". "-E soube-te bem?" - perguntei. "-Sim, fiquei melhor, mas não digas nada, está bem? -"Claro, é um segredo nosso, fica descansada". E selei a conversa com uma piscadela de olho retríbuida.
Fiquei maravilhada com isto, que, racionalmente, não tem nada de especial, pois não é novidade para mim, nem para nenhuma colega, que os miúdos "nos levam para casa" e nos deixam ir pairando por lá, ganhando forma através do que dizem, do que contam. Mas a forma como me disse e o facto de ter transposto para lá, uma dica que dei, em grupo, faz-me sentir referência na sua vida e no seu coraçãozinho, mesmo que depois, com os anos, eu venha a ficar sossegadinha num cantinho distante da sua memória, só ativado quando nos vêm e alguém lhes faz referência a nós, com um "então não te lembras da Paula?
Este dois episódios de seguida, relatados em Medos e Medos II, têm-me adocicado o ego e servido de bálsamo fresquinho para uma irritação constante que me aflora o espírito de cada vez que me lembro da bendita prova de avaliação de conhecimentos que agora se propõe (impõe) aos professores contratados e sobre a qual já falei aqui. (http://agridoceedoce.blogspot.pt/2013/11/circo-es-afetivamente-densa-e-por-isso.html).
Não gosto de estar sempre a "chover no molhado", batendo na tecla de coisas que nos transcendem completamente e contra as quais não podemos lutar, mas esta irritação constante está-me no espírito, no pensamento e nas conversas com tantos e tantos colegas na mesma situação que eu e se isso me dá uma sensação boa de corporativismo coletivo e profissional, também me dá, paralelamente a certeza de que estes episódios que relato e tantos e tantos e tantos outros que fazem parte da vida de um professor, não poderão aparecer nunca em enunciado nenhum de nenhuma prova e muito menos, em qualquer resposta. E esta certeza e só esta, para além de tornar qualquer prova em algo absolutamente redutor, edifica-me de novo...