domingo, 22 de outubro de 2017






COISINHA DE NADA

(que é tudo, tudo, tudo...)


Falavas da tua vida por lá, da pressa, das coisas, do ritmo, de tudo e de nada, numa conversa banal para matar o tempo. Falavas em tom sereno, mas rápido. É sempre um prazer ouvir-te falar. Herdaste o tom e o jeito da tua avó materna, já te tenho dito e ainda bem. As tais serenidade e entoação que contagiam, na maior parte das vezes. Relatavas que o encontras com frequência. Que é chatinho e que normalmente estás com pressa quando te aborda, mas que intuitivamente pressentes que tens que lhe dar um bocadinho de atenção, vês que fica agradado, reconhecido e então,  espontaneamente, ages assim e sem te aperceberes, humanizas uma pressa doida de todos os dias, que nos afasta, sem que nos apercebamos, dos afetos simples nas relações com os outros. E só esses Bea, nos tornarão especiais.
Senti-me muito orgulhosa, dessa coisinha de nada que me contavas tão ocasionalmente. Não te disse, mas guardei cá dentro, neste coração elástico que tenho, igual ao coração elástico de todas as mães do mundo, que lhes dá esta capacidade de se orgulharem muito dos filhos, mesmo com estas coisinhas que contam numa conversa qualquer.
Percebi, pelos relatos soltos que ias dando, desse episódio e de outros que tais, que já aprendeste o mais importante e que, sem saberes, tornas-te especial por seres assim.
Isto filha, nenhum curso te dará. E mesmo sendo tua mãe e podendo ter sempre a visão desfocada de amor, acho a sério, que esta coisinha de nada, pode às vezes ser tudo, porque faz a diferença e torna-te especial.
LUV U!!

sexta-feira, 13 de outubro de 2017





CÉLULA PEQUENINA



-Quero que o meu filho se orgulhe de mim, esta ideia persegue-me todos os dias e estou constantemente a pensar nisto- dizia com ênfase. As outras que a acompanhavam lá participavam também da conversa trivial, naquele início de manhã. Não pude deixar de ouvir. As mesas de alguns cafés têm tudo menos privacidade e as conversas podem acabar por ser tudo menos secretas. E muitas, davam teses de doutoramento. Não pensei logo nesta conversa específica. O meu cérebro centrou-se naquele pedacinho de tempo em que ali estive, meio anestesiada e cansada por este ritmo profissional louco que tenho vivido e que me suga até às entranhas, esgotando-me as energias. Senti-me assim como uma ameba, parada, com um corpo de camadas gelatinosas que me tiravam o movimento e a reação. Sim, lá no fundo estaria o meu cérebro, qual núcleo pensante, mas ali naquela hora, não fiz uso dele. Só gozei o sol que me dava na cara, pus um sorrisinho parvo e não pensei.
Mas a frase voltou depois às minhas sinapses e questionei-me depois sobre o que ouvi.
Nunca me dominou esta ideia de pensar se os meus filhos têm orgulho em mim, no pai, em nós. Claro que tenho esse desejo. Não sou alienada e penso como qualquer mãe, mas isso não me persegue. Nem determina nenhuma das minhas ações com eles, ou seja, não faço isto ou aquilo SÓ para que se orgulhem. Não. Faço isto ou aquilo porque acho que está certo e acredito que essa verdade emocional passará pelos póros e pela vida como um testemunho de autenticidade e disso gostava sim, que tivessem orgulho.
Eu tenho um orgulho enorme nos meus Pais. Tenho um orgulho enorme na célula pequenina onde nasci e onde cresci, onde me estruturei como pessoa e onde aprendi, por osmose e por isso sem grande esforço, como é viver em família, ter um pai e uma mãe que se amam e dois irmãos com quem se partilha um palco de afetos.
Hoje, por circunstâncias várias, tive oportunidade de constatar com força qual é o tipo de Pais que tenho, que referência foram um para o outro, que referência foram e são ainda, a tantos níveis, para nós e de que forma saudável me fizeram crescer, equilibrando afetos, amadurecendo capacidades, depurando defeitos e apurando qualidades. Este processo não se esgota, continua em andamento, afinal, temos a vida toda para isso, mas foi ali que começou. E começou tão bem!
Estariam os meus Pais (demasiadamente) preocupados em que tivéssemos orgulho neles? Seria esse um pensamento que os perseguia? Creio que não. Foram só eles próprios, autênticos, seguros e sinceros emocionalmente, entre eles e connosco.  E bastou, bastou só. E foi tão bom.
Quem sabe não se passará o mesmo por aqui? Deus queira que sim! Afinal, a história repete-se e as referências, tendem-se a imitar, não é o que se diz? 
P.S. Olha quem diria o que haveria de vir de uma conversa ouvida num café?

segunda-feira, 9 de outubro de 2017





VERDADEIRINHO DA SILVA


Às vezes penso na reação das pessoas ao lerem este blog, as que lêem. E se isso nunca foi uma preocupação para mim, ao longo destes anos, farto-me de dizer, e é verdade, já que escrevo sem freio, ou filtro editorial (o que quer que isso seja)sem a preocupação de pensar quem está a ler, ou o que poderão pensar, tal e qual o caderninho preto de que às vezes falo; dei hoje dei por mim a pensar nisso: fogo, acho que consigo ser chata, ou então muito nhónhónhó, sempre a falar no mesmo, 
nos filhos, no marido, no trabalho, no que sinto, no que achei, no que vivi, naquelas lamechices que devem soar para muita gente a Nicolas Sparks, ou Nora Robertsque não há pachorra (que me perdoem os aficionados, porque não li nunca nada deles e posso estar enganada, mas é a ideia que tenho...).
  
Sim, sei que há vidas muito mais interessantes, luminosas e cheias de coisas para dizer, opiniões mais consistentes, eruditas e informadas, escritas mais elaboradas e/ou argumentativas, textos mais intencionais e expositivos, mas eu gosto de escrever sobre o que me preenche e esse preenchimento é dado por coisas tão simples, que me questiono como é que um POUCO pode dar tanto que dizer, assim numa infinitude de assuntos que não acabam. 
E que bom a minha vida simples ter tantos assuntos que não acabam, mesmo que tenham, tantas vezes os mesmos sujeitos. Que bom sentir de vez em quando um click delicioso de os querer passar para este papel virtual que substitui o caderninho preto. Que bom sentir que, apesar da (suposta) pouca originalidade, tenho tanta gente que me lê e que se identifica. Que bom sentir que escrevo de coisas simnples, que afinal são tão intensas. Será sinal de autenticidade, suponho... Deus queira que sim, porque lá verdadeirinho da silva é este blog. E que assim continue. Mesmo que às vezes me passe pela cabeça que é nhónhónhó.
Hoje, apeteceu-me dizer isto!


terça-feira, 3 de outubro de 2017






LATITUDES


Ia pela mão da avó (suponho eu que seria a avó) e eu ouvia-o dizer numa voz pequenina, de 3, 4 aninhos: -"quero a mamã" - que repetia, tipo ladainha. A avó respondia-lhe que a mamã estava numa reunião e perguntava-lhe se queria ir comer um gelado, ou uma torradinha ao café. Que não, não queria, o que queria era mesmo a mamã. " - A mamã está numa reunião, repetia-lhe. Que a reunião é má, queria era mesmo que a mamã estivesse ali. Enquanto o passeio de asfalto durou e eu lhes segui os passos, ouvi aquela conversa a dois que me enterneceu. Qual torradinha, qual gelado, a mamã é que era ao fim de um dia de escola. Haverá melhor que isso?
Depois, na sala de espera da consulta a que fui, nem de propósito: consultório vazio e a funcionária aproveita para telefonar à filha. Apercebo-me que a gaiata será pequenita, pelo tipo de conversa e pela condução das respostas. Do lado de lá, excitada conta-lhe qualquer coisa da escola e pergunta à mãe quanto tempo mais demorará a chegar. -"Então guarda bem o que me queres dizer, que a mãe está quase a chegar, ok? Já não demoro - responde-lhe... - "Então, filha, mas o meu trabalho ainda não acabou..."

Pois é, pois é... Por maior que seja o nosso (seu) mundo, por mais afetos espalhados, sólidos, pedagógicos, verdadeiros, equilibrados que tenhamos, por mais que arrumemos desde pequeninos o nosso dia dividido entre tantas outras coisas, por mais que cresçamos e nos sintamos saudáveis (nós e eles) com tudo o que nos rodeia e por mais que isso nos faça bem, é a mãe que queremos tantas vezes, é o colo dela que pedimos, é a voz dela que queremos ouvir. Será uma verdade universal e intemporal, esta. Quase como uma regra. E mesmo com todas as exeções a esta regra, que existem, porque o mundo tem muitas cores e formas e tamanhos e sentires, atrevo-me a dizer que, em qualquer latitude, será assim.
Também cá em casa, nesta latitude tão minha e especial!


P.S. Claro que já preferem a torradinha, em vez da mãe (dizem eles...), mas no fundo, no fundo...